terça-feira, 12 de julho de 2005

SPAH brasileiro

eu falo prás pessoas que tudo o que eu fiz na vida pela gaita foi com o intuito de promover o SPAH brasileiro. Mas o que é o SPAH, exatamente?

pelo site do SPAH, vê-se que não passa de uma organização americana sem fins lucrativos que promove a preservação e a evolução da gaita, distribui uma publicação e promove o famoso festival de 5 dias, anualmente. O SPAH existe desde 63. Custa US$ 40 dólares a anuidade e ser associado dá desconto no preço do evento.

o evento deste ano é em 16 de agosto, num hotel em Kansas City. Aqui, programação, preço e todas as informações do seminário.. Resumindo, de terça a sábado, cerca de US$ 200. US$ 40 por dia de evento, praticamente.

no outro lado do atlântico, existem outros eventos, às vezes promovidos por fabricantes de gaitas, com vários pequenos shows em hotéis e cafés, como o de Klingental, na Alemanha.

no Brasil, a coisa mais próxima disso é o festival internacional de harmônica organizado anualmente no SESC Pompéia em SP, pelo Flávio Guimarães e pelo Chico Blues. Os preços costumam ser populares e aparecem umas canjas no Mr Blues também, após o show. Contudo, nem o Flávio nem o Chico são organizações sem fins lucrativos, é um evento como qualquer outro, porém de alta qualidade com músicos profissionais.

o que já se tentou, sem muito sucesso, foi organizar eventos paralelos em SP durante esse festival, e embora muita gente do país todo vá ao evento, não existe uma grande confluência de gaitistas. O gaita-l, a lista de discussão nacional, que conta com centenas de gaitistas inscritos, é silenciosa e apenas uns 20 ou 30 participam ativamente. Músicos profissionais não costumam ver vantagens na lista, já que a maioria é formada de iniciantes, sempre com as mesmas perguntas. Apesar dos pesares, ainda é a lista mais significativa do país em termos de comunicação.

outras tentativas locais são os pequenos eventos promovidos de forma amadora (no sentido estrito do termo, pois quem dá o sangue nesses eventos realmente ama gaita), em especial em BH pelo Leandro Ferrari, em Campinas e em Santos. E claro, o lançamento do CD do gaita-L, que já foi em BH, no RJ, em Santos e este ano deve ser em BH de novo.

é interessante pq o terreno que parece ser mais fértil é o da cidade "média". O tradicional eixo RJ/SP, apesar de ter a maioria dos gaitistas profissionais, não possui uma organização entre os gaitistas. Pequenas cidades provavelmente não possuem massa crítica. Restam as cidades "médias" como Santos, BH e Campinas, como pequenos focos de gaitistas mais ou menos organizados, grande parte devido à quantidade mínima necessária de gaitistas para a coisa andar aliado a uma carência de bons shows locais. E ao mesmo tempo, justamente pela falta de bons shows locais, nessas cidades é ainda mais fácil negociar lugares bons para as apresentações.

outro elemento catalisador de gaitistas são os festivais de blues, que andam diminuindo, e que depois do fracasso de público que foi o festival de blues em BH no Marista Hall e com o fim do festival de blues do Mineiríssimo, tendem a diminuir ainda mais especialmente em BH.

uma vez eu conversei com o Helton Ribeiro por telefone uns 3 anos atrás e ele me dizia que a tendência era o mercado do blues se mover de novo para o interior de SP, que era fácil para o músico e o público paulistano ir e onde havia demanda e poder aquisitivo. Provavelmente Ribeirão Preto e Campinas devem ser os alvos mais visados desses festivais.

Outros festivais de blues têm sobrevivido bem, como o de Guaramiranga (CE) que acontece durante o carnaval e parece ter um bom apoio do estado, pois certamente promove o turismo e aproveita uma época do ano em que os amantes do blues e do jazz ficam à mercê do axé, e os festivais no sul do país, como o promovido pela Miller e pelo whisky JB. E tem tb o festival de Rio das Ostras, no RJ. Minas Gerais, novamente, ficando para trás, pois quase não se ouve mais falar do Ibitipoca Blues. Ouro Preto tem um bom festival de Jazz, mas normalmente não abre muito espaço para o blues, e custa os olhos da cara. Gaitista em geral é pobre. Blueseiro em geral é pobre.

às vezes, inclusive, boas intenções aliadas à falta de profissionalismo mais contribuem para queimar o filme do que para promover mesmo, mas mesmo assim, são iniciativas heróicas.

a diferença entre os EUA/Europa e o Brasil em relação à gaita, e é uma das coisas que mais dificulta o SPAH no Brasil, é o fato de que a gaita faz parte da história e da cultura desses lugares. Muitos shows do SPAH são aquelas orquestras locais de velhinhos tocando cromática junto. Muitas das gaitas vendidas na alemanha (e eu desconfio que seja inclusive a maioria, assim como eu sei que é no Brasil) são aquelas gaitas tremollo para música tradicional.

No Brasil, a gaita é a gaita de blues e ninguém lembra do Edu da Gaita ou dos Harmonikings. Até o surgimento do Blues Etílicos na década de 80, haviam décadas que a gaita estava limitada à cromática do jazz e do chorinho de Rildo Hora e do Maurício Einhorn.

O Brasil não tem massa crítica nem proximidade com as fábricas (há apenas a Hering, em blumenau, com capacidade muito limitada de investimento nesse tipo de evento) nem com os artistas, que não são tantos assim. A gaita não está na moda (mas estava na década de 40) e o movimento de gaitistas dá espasmos quando surgem uma Alanis ou um Bob Dylan tocando alguma coisa.

Não há grandes fábricas de amplificadores ou gaitas, e embora hajam o André Serrano e o Diogo Farias, são serviços customizados e cada um numa ponta do país.

Pode-se passar uma vida inteira lutando por um ideal sem nunca chegar perto do objetivo. Eu desconfio que comigo vai acontecer algo assim. Eu vejo pessoas como o Ronald Silva, que conseguiu organizar a Trupe da Gaita, nos moldes do Borrah, com um certo sucesso, pois provavelmente Curitiba tem os gaitistas com mais técnica e conhecimento de teoria e repertório do país, graças ao talento do Ronald, mas está longe de trazer "a época de ouro" de volta. Os que viveram aquela época devem guardar uma nostalgia tremenda e ver com olhos desconfiados as gerações de gaitistas atuais, mais influenciados pelo blues, salvo alguns poucos gaitistas que se dedicam a explorar o espaço aberto da gaita na música brasileira.

Eu acredito que um dia, essas "células" de alguma forma vão funcionar juntas. Campinas, organizado pelo Fernando Xavier, está bem próximo de SP, mas eu não ouço falar muito deles. Santos não têm muitos gaitistas virtuosos (mas têm), mas tem a maior quantidade de gente empolgada que eu já vi, e por isso mesmo eles conseguem manter uma regularidade no movimento de gaita deles, ao mesmo tempo em que eles se transformaram num grande grupo de amigos, organizados pela "mente criminosa" (no bom sentido) do Morenno.

BH tem gaitistas ótimos, alguns começando a aparecer, outros voltando agora com o movimento do grupo de estudos. Particularmente, acho que hoje em dia, proporcionalmente falando, apesar de BH ter poucos gaitistas, têm gaitistas amadores de muito boa qualidade e timbre, mas que estão parados por falta de tempo ou de banda. Mas existe, até certo ponto, boas amizades e espaço para todos tocarem e aparecerem. O Pedro desapareceu, mas o Fred está evoluindo rápido, o Samir já está no ponto, o Osmar está correndo atrás e até da Mariana, com sorte, ainda vamos ouvir falar (e tocar) este ano. Muitos gaitistas e poucas bandas. E nenhuma casa especializada em blues, mas ainda assim, muito espaço. O palco paladar foi uma das gratas surpresas da cidade, e ainda assim, eu ainda estou cavando mais lugares e outros "nichos"... o Deja Blue vai tentar voltar à ativa, com reforços e mais bluesy, o Hot Spot ainda abre espaço para canjas, e o inverno é época natural de curtir blues à luz de velas num café pequeno e quentinho, num clima aconchegante e intimista.

Com o grupo de estudos, as férias de julho, o minas harp em agosto e mais um monte de pequenas coisas boas acontecendo nos bastidores da gaita em BH, acho que estamos num momento bem propício da coisa andar e acontecer, pelo menos por aqui. Em especial, o grupo de estudos daqui deve começar a promover o intercâmbio e a troca de informações entre os grupos de estudos, diminuindo as distâncias. Eu queria muito, e vou dar um jeito, de manter contato entre os grupos de santos e de SP (olha eu cutucando a Clara), trocando material e informação.

Outra coisa que está fazendo falta é filmar essas coisas. O Chico Blues conhece o filão dos vídeos, e as filmadoras estão caindo de preço... grupos de estudos viajando para se encontrarem, ou organizando pequenos eventos juntos...) É, o zé não devia ter me dado aqueles pães de queijo de provolone.

A longo prazo, eu sonho com o SPAH brasileiro, e ele vai ter que ser inventado por uma fórmula própria pq o Brasil não tem nada que ajude além das pessoas, com sua paixão pela gaita e sua facilidade de relacionamento. A curto prazo, eu faço o que posso pela manutenção dos grupos de estudos, para que durem e que sejam bons enquanto durem. A médio prazo, eu quero ver se o lançamento do CD do gaita-L, sendo em BH, vai poder contar com as pessoas que estão voltando a tocar em BH, e que devem estar afiadas até o fim do ano, para ser pelo menos uma referência na cidade, ou no estado. Assim, um passo de cada vez. Mirando na cabeça prá acertar pelo menos no pé.

Viajando um pouco na maionese, eu queria muito que o grupo de estudos desse origem a uma apresentação conjunta, em pares ou em trios de gaitistas, e que fosse algo apresentável num pequeno café, e que um dia o pessoal topasse viajar junto para tocar numa desses cidades legais vizinhas de BH (Ouro Preto, Tiradentes, Lavras Novas). O grupo da Clara (onde eles estão? cadê o email deles?) está muito perto de conseguir algo assim.

No dia em que umas duas ou três associações de gaitistas estiverem entrosadas o suficiente, fazer o festival paralelo e independente na época do festival internacional de harmonica de SP vai ser mais fácil. É sonhar e fazer por onde.

7 comentários:

  1. Tio Kenji, seus sonhos "impossíveis" já fizeram muita coisa e não tem motivo nenhum pra não continuarem fazendo! Spah sim, por que não? A gente ajuda...

    Muito bom texto.

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  2. Eu compartilho do seu sonho tb. Sonho com SPAH, com Milteau, Brendan, Del Junco, Baker tocando por aqui.
    O grupo que eu faço parte participa pouco da net, só o Fernando entrou para a lista agora, mas esse ano estaremos tocando em BH. Eu pelo menos coloco pilha na galera em todos os ensaios e esse ano tb vai ter duo meu e da Mari, já que é uma promessa antiga que será cumprida, não é Mari?
    Por aqui ando a fazendo a minha parte e tô sempre disposta a trocar informações, mandar cds e vídeos pra galera e sempre contar as novidades. Vamos torcer!!!
    Daqui a pouco estarei no show do Gabriel, amanhã conto o que rolou.
    bjo

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  3. Clarinha, este ano nossa música sai de qualquer jeito! ;-)

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  4. tem que sair... e o tendal (é assim que chama) precisa dar as caras em BH... casa e comida a gente garante do lado de cá ;-)

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  5. Hei Kenji,
    vc conhece o Marine Band Club?
    http://membres.lycos.fr/harpedge/asso.html
    O site é francês, mas dá para entender com um tradutor. A idéia deles é bacana e reuni bons gaitistas. Foi encabeçada pelo Milteau.
    bjo

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  6. eu tinha ouvido falar desse lance sim. bem bacana.

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