Ivan Márcio, Jason Ricci e a doação de músicas para a Web

Ivan Márcio, além de um ótimo gaitista, canta bem pacas e é gente boa prá caramba. Da última vez em que eu encontrei com ele em SP, no SESC, rolou de bater um papo com o cara. Naquele dia ele já me avisou que em breve sairia a demo dele. Bem, a demo saiu e está disponível para download no site dele.

Sobre a demo, bem, basicamente tem o padrão Ivan Márcio de qualidade, que vc também tem ouvindo ao Mr. Mojo e à excelente Prado Blues Band.

Mas ao invés de falar do Ivan e do seu trabalho, eu gostaria de chamar a atenção para o **modo** como ele disponibilizou a demo na web. Estão disponíveis as músicas e o encarte (o velho modelo de distribuição dos cds do gaita-l...), que eu achei muito legal da parte dele.

Por mais trivial que possa parecer, eu acho que existe uma grande diferença entre um artista disponibilizar na web alguns mp3 e vídeos do youtube e ele disponibilizar o cd mesmo, para quem quiser baixar.

Eu lembro, ainda na época em que eu estava na faculdade (antes de 99), um colega meu que tinha acabado de voltar dos estados unidos me falava que o CD como mídia iria morrer em breve. Realmente, para uma parcela grande da população que tem poder aquisitivo (estima-se que no Brasil, a proporção de usuário com acesso banda larga e acesso telefônico seja da ordem de 50%/50%), o CD está morto. Até o Chico Blues já vende cds de mp3.

Neste aspecto, as pessoas podem pensar "o Ivan gastou uma grana produzindo um cd profissa com capa bacana e tudo prá dar de mão beijada na web?", e na verdade acho que ele foi muito esperto com isso. Sim, superficialmente, vemos a ponta do iceberg que é "olha, o cd do cara na web! com encarte e tudo!". Mas uma observação mais cuidadosa mostra que

- disponibilizar o cd e a arte permite que qualquer pessoa baixe tudo o que é necessário para reproduzir o CD. Isso significa que os fãs que querem ter o cd podem ter efetivamente um cd apresentável em casa. Isso é extremamente simpático.
- cd dá dinheiro? no caso dos gaitistas, que têm um mercado muito restrito, e por que não, muito competitivo, eu acho que cd não dá dinheiro. Um cd demo então nem se fala.
- mas investir na produção do cd (uma boa capa, uma boa gravação) sinaliza pelo menos duas coisas importantes: respeito com o público e profissionalismo. Prá platéia gaitista, isso pode não ser tão importante (vc pode baixar um mp3 do Brendan Power e se importar só com a técnica dele), mas para a platéia de iniciantes, de pessoas que estão longe do mercado de cds, das lojas, um cd baixável é um item de consumo como qualquer outro, e algumas pessoas prezam por ter um cd bonito e apresentável.

E quem é o público de um cd demo com encarte disponível para a web? Certamente não é o gaitista, que já conhece o trabalho do Ivan, mas justamente os simpatizantes e os possíveis contratantes.

Para mim, o que mais contou neste caso, e que é o realmente o motivo desse post, é que a internet é exatamente o lugar que existe para compartilhar coisas. Comporatilhar cds, informações (o que são os blogs?). O que se ganha com isso? Fora as coisas mais rasas como dinheiro e prestígio (que eu acho que não se ganha com blogs, senão eu teria este blog cheio de google ads), eu acho que o intuito do blog é NÃO GANHAR NADA. Se vc quer compartilhar coisas sem esperar nada em troca, a internet é um ótimo lugar. Veja o software open source. O cd demo do Ivan é música open source.

Outro cara que faz isso magistralmente é o Jason Ricci, na minha opinião, o gaitista mais interessante dessa nova geração de gaitistas que pesam mais nos ritmos funkeados e que usam e abusam dos overs. Procure pelos vários shows excelentes dele no archive.org e vocês vão ver que isso tudo só serve para o público saber ainda mais o quão foda o cara é.

Jason Ricci. Será que um dia ele vem pro SESC, já que nem a agenda nem o orçamento conseguem trazer o Milteau?

E como se pode ver do próprio open source, tem gente que defende mais pela intenção altruísta que há por trás que qq outra coisa. A simpatia é uma das publicidades mais difíceis de comprar. E se o Ivan tiver um marketeiro esperto atrás do seu trabalho (e talvez intuitivamente ele seja um), ele já deve ter percebido que a atitude do Ivan de ser sempre esse cara boa praça é uma das melhores publicidades que um gaitista poderia ter.

Gaitistas: se vcs têm cds fora de catálogo, não deixem a música morrer dentro de seus armários. Coloquem os cds para download com as capas e a música de vcs viverá para sempre.

Em tempo, a capa do cd do Ivan tem ele vestido com aquele ar vintage pós-guerra que eu malhei neste memorável post (teve 20 comentários!). Antes de mais nada, eu queria dizer que eu custo coisas vintage como pin-ups e entendo perfeitamente o marketing da Prado Bluesband de ter a imagem associada a este estereótipo do pós-guerra.

O Ivan também sabe que se ele me aparecer lá em casa com essa roupa da capa do CD demo dele, que eu vou dar boas risadas, e conhecendo o cara, ele também. Ambos temos noção do que é imagem e o que é roupa prá ir comprar pão na padaria. ;-)

De qq forma, a roupa é a menor das preocupações aqui. ;-)