fui lá, conferir os shows do Diogo Farias, Rodrigo Eberienos, Benevides Jr, José Staneck, Jefferson Gonçalves e André Serrano.
Quinta: cheguei no aeroporto na quinta de madrugada, perto de 1 da manhã. Diogo tava 48 horas sem dormir direito, de plantão, com a Michele, grávida de 8 meses, no aeroporto, para pegar eu e a Lud. Ficamos mais um pouco para esperar o Eberienos chegar. Nesse meio termo, o Diogo nos conta que no mesmo dia, um amplificador do Andy tinha queimado pq tinham ligado por engano em 220V, queimando, felizmente, só o transformador. O hotel onde os gaitistas iam ficar, no centro de Fortaleza, tinham furado com eles e tiveram que arrumar de última hora, um hotel mais longe, na correria de uma cidade que estava recebendo as principais bandas pop do Brasil no Ceará Music. Um evento destes também trazia uma complicação extra: a maioria dos roadies, técnicos de som, hotéis e estúdios estavam indisponíveis por conta do evento paralelo, assim como grande parte do público. Mesmo assim, uma das propostas do fórum era justamente oferecer uma alternativa cultural ao Ceará Music.
Sexta: enquanto o Diogo sai para ajudar na organização do festival, o Kenji e a Lud vão para a praia do futuro, um pedaço do paraíso na Terra e ficam por lá o dia inteiro. Voltamos no fim da tarde para tomar banho e ir para o show no dragão do mar. Ganhamos duas camisetas muito legais do evento, uma delas com a logo do cara tocando gaita, e outra com uma gaita estilizada, que tb vem tatuada no braço do Roberto Maciel, um dos mentores do evento. Chegando lá, fui ao camarim dos gaitistas, onde entreguei a encomenda de porta-gaitas do mário para todos. Andy Boy soldando um loop de efeitos no amplificador, recém consertado por um amigo do Diogo. Primeiro dia de show, Diogo e sua banda, De Blues Em Quando, abrem o festival com boas músicas, incluindo um hino à sogra... segue o show de Andy e Jefferson, dividindo o palco com a banda Blue Label, num belo show cheio de duelos e com o Andy cantando, um dos raríssimos casos de gaitista e blueseiro com capacidade para cantar, no cenário brasileiro. Roberto Maciel toma um merecido porre de whisky, pq o festival agora tinha começado. Eu teria tomado um tb. O show termina numa boa pizzaria ao lado do dragão do mar, onde a pizza de rúcula com tomate seco se tornaria a favorita de todos os pós-shows.
Sábado: acordamos cedo para chegar à câmara dos vereadores uma hora antes do workshop, para resolver os últimos pepinos. Workshop transmitido ao vivo na TV local. Cerca de 30 crianças carentes auxiliadas pela fundação Raimundo Fagner ganham free blues cedidas pela Hering. Aquela criançada tocando ao mesmo tempo (eu filmei isso!) e os gaitistas convidados no plenário, completamente aterrorizados com aquele público. Elegem o Benê para lidar com a criançada, que extremamente educada, se calava a cada pedido do Benê. As crianças aprendem noções básicas e conseguem fazer a escala de dó nos dois sentidos da gaita. No dia seguinte, serão cobradas a tocar uma música simples como Asa Branca ou Oh Susannah. Depois vem um rápido workshop sobre técnicas básicas, para alguns poucos gaitistas interessados. De tarde, passamos na escola de música onde ficava o estúdio onde o Eberienos ia passar as músicas. Alguns músicos tinham esquecido de aparecer. Diogo nos conta que alguns músicos simplesmente não honram seus compromissos se outros que paguem mais aparecerem depois. É com este tipo de coisa que ele tinha que lidar. O segundo dia de show começa com Benevides e uma roda de chorinho, que contava com um senhor luthier de pandeiros e seu filho de 9 anos. E o menino simplesmente arrasou no pandeiro, enquanto Benevides arrancou uma platéia aplaudindo de pé por 5 minutos. Em seguida, Staneck desfila um repertório de standards do Jazz e da MPB, dedicando "A child is born" para a Michelle e para o Rafael. Foi a primeira vez que eu vi alguém tocar toots melhor que o próprio. E terminou com o Eberienos tocando uma seleção de músicas de gaitistas, um pouco prejudicado pelo reverb, mas mesmo assim, fenomenal. A noite termina novamente na pizzaria, desta vez com o alívio de que estava quase tudo terminado. O show deste dia foi filmado e deve virar um DVD em breve. Não percam.
Domingo: workshop pela manhã. As crianças voltam e várias haviam tirado pequenas músicas. Tocam em uníssono e pela primeira vez eu ouço 30 gaitas tocando ao mesmo tempo na minha frente. Aproveitei para conhecer pessoalmente o Igor, gaitista de lá, e saber um pouco mais do cenário de Fortaleza. Finalmente, o workshop de amplificação do Andy e o workshop de microfones do Diogo, e foram os workshops de equipamentos mais bem completos que eu já vi. O Diogo simplesmente esmiuçou todas as sutilezas dos diferentes tipos de microfone comparando um a um num serrano amp tocando pelo eberienos, até chegar no surpreendente microfone com cápsula de telefone vitaminado com um transformador de sinal que deixou um microfone de cápsula de 10 reais com som melhor que de um green bullet. Finalmente, o último workshop, Benevides abre uma gaita e mostra rapidamente como dar manutenção básica numa diatônica.
Fim de jogo no maracanã. Eberienos corre para pegar o avião, os demais ainda conseguem almoçar num hotel do centro (eu e a Lud tb, de rebarba) onde Roberto Maciel e Diogo já conversam sobre a próxima edição do Fórum, que pela conversa, vai ser no mínimo melhor que este, após o aprendizado na unha. Fomos eu e a Lud para a feira de artesanato na praia e pegamos um peixe bom como não comíamos a anos. Voltei para a casa do diogo, onde copiei mais alguns DVDs para trazer para BH. No mesmo dia, Michelle já sentia algumas contrações, iniciando o trabalho de parto. Mas acho que ainda não nasceu, mas está a caminho. O pobre do Diogo ainda foi nos levar pro aeroporto (não tem táxi de madrugada em Fortaleza se vc não agendar antes) de madrugada (nosso vôo era 5 da manhã) e ele ainda ia fazer uma cirurgia às 10 da manhã do mesmo dia.
Claro que não tem tudo contado aqui. Nâo tem as conversas que eu tive com o Benê, com o Jefferson sobre o blues, com o Andy Boy sobre cantar e sobre a linguagem do blues nacional, com o Staneck sobre suas gravações, com o eberienos, que me emprestou o IPod cheio de preciosidades como ele tocando samba funk, umas coisas exclusivas e uma gravação do Levy com orquestra. Não tem a conversa com a Michelle sobre as diferenças entre Fortaleza e BH, não tem as piadas que o senhor que fazia pandeiros me contava nos intervalos das músicas, nem da incrível seriedade e dedicação que são detalhes marcantes do Diogo e do Roberto Maciel, nem dos Arre-Égua que o Andy berrava, nem do colchão do Andy que esconderam, nem do Staneck sendo sacanaeado pelo Jefferson por causa de um efeito de língua, nem de uma cantora de MPB local que era igual à Cássia Eller nem da conversa que eu tive com uma das moças que trabalham na Fundação Fagner, que largou um bom emprego de engenheira na companhia de luz local para dormir mais tranquila todas as noites, ajudando todas aquelas crianças no trabalho fantástico que eles fazem, e que para mim, foi o grande diferencial do evento: o detalhe social, que SPAH nenhum teve. Se há uma coisa que o SBRAH deve seguir como caminho próprio, certamente deve ser lembrar sempre do social. Acho que a cena mais fantástica que eu vi foi o Jefferson pegando praticamente todo o material promocional e o DVD de aula dele e dando para as crianças. Ou o Staneck mexendo os braços para dizer às crianças que era para aspirar ou para soprar, quando não levantava para ir em alguma criança específica, corrigir-lhe a gaita na boca.
Infelizmente, meus amigos, vcs vão ver as fotos, vão ver o DVD, vão ver os shows, vão saber dos casos pq eu estou contando. Mas infelizmente vcs não estavam lá para ver cada uma daquelas crianças. Cada uma delas.
Os shows não são nada, os workshops não são nada perto daquelas crianças.
Eu me lembro da Lud me contando um caso sobre um avô dela, que na verdade nem era avô de verdade, mas que era meio cego por causa de um colírio receitado errado, que pegava um acordeon do alto do armário e tocava para ela, quando ela era bem pequena. Ela achava a coisa mais linda do mundo. Anos depois, ela veio a saber que o avô dela não sabia tocar nada daquilo, mas que mesmo assim...
O que as pessoas precisam se lembrar do evento é de como as lembranças de infância da gente ficam na cabeça da gente. Essas coisas que parecem pequenas e banais para nós, não são banais para elas. Pode até ser que elas troquem as gaitas por balas daqui a uma semana, e pode ser que não saia gaitista nenhum dali. Mas se vc dá perspectiva para quem tem tão pouco, vc está dando o que uma pessoa poderia precisar para a vida inteira dela.
Isso tudo aliado à grandiosidade e ao sacrifício de todos aqueles que fizeram o que podiam e o que não podiam para fazer acontecer este evento, que podia não estar lotado, mas que não pisou na bola um minuto sequer, apesar de todos os reveses, que fiz questão de enunciar todos neste post, me fizeram sentir especial e incrivelmente feliz de ter podido conhecer Fortaleza e as pessoas incríveis que moram lá. E claro, de ter visto os shows, conversado com as pessoas e tudo o mais.
Tentem não perder o próximo. Eu sei que é uma viagem cara e que eu fui privilegiado de poder ter ido, pq é uma viagem cara e eu tinha onde ficar por lá. Mas façam um esforço e prestigiem o que é empolgante, deslumbrante e nobre.
Fotos Diogo
Fotos Eberienos
Fotos Kenji (1)
Fotos Kenji (2)
Fotos Kenji (3)
Nossa, quase chorei. O texto é muito, muito, verdadeiro. Eu também me sinto privilegiada por ter tido a oportunidade de estar lá. São coisas e sentimentos que só podem ser proporcionadas por pessoas como o Kenji, o Diogo, a Michele, a mãe da Michele (tb conhecida como 'a sogra' por causa da música que ela inclusive encara no maior bom humor) todos os gaitistas (Eberienos, Benê, Jeferson, Staneck, Andy Boy, sempre simpáticos e acessíveis) que estavam lá, os músicos, o senhor do pandeiro e o filho dele, o Roberto Maciel, a namorada dele, a moça da Fundação Fagner, a equipe que acompanhava o Roberto pra baixo e pra cima, pessoas que eu nem sei o nome mas que contam com a minha absoluta simpatia e agradecimento. Foi realmente, muito bom. :D
ResponderExcluirinveja, inveja e inveja!!!! no bom sentido é claro...
ResponderExcluirPelo menos eu sei que tentei ir, mas infelizmente não deu. Mesmo assim, como diz o Eisinger, muita inveja no bom sentido! Eu tinha certeza que quando ouvisse / lesse os comentários do encontro ia ficar babando. Estes encontros são sempre fantásticos e um desse porte não poderia ser perdido. Para quem não foi resta correr atrás das informações e tentar construir, mesmo que mentalmente, um pouco daquele momento...
ResponderExcluirCara aidna bem que pude ler essas coisas´.
ResponderExcluirJá deu pra sentir que 2006 tem de novo e nesse se Deus quiser irei.
Cara tudo de bom e continue com esse trabalho ele é importante para todos os gaitistas (inicantes ou não)!
Abração
Muito bom o texto tido Kenji, deu uma pena por não ter ido lá, mas sei que fomos bem representados. Na próxima eu vou, com certeza!
ResponderExcluirA minha passagem para fortaleza ficou guardada na gaveta (snif :.(
beijos
hmmm... Que sensibilidade.. que lindo... que bicha...
ResponderExcluirTe amo, tenho saudades de todos :-)
GAISHPAR!!!! eu tb te amo, mesmo vc tendo engordado bragaralho! ;-) hehehehehe vida boa de casado, hein?
ResponderExcluirEsses caras somem, deixam de dar noticia... foda... Volta pra lista gaishpar...
ResponderExcluirMuito bom o texto, melhor ainda a atenção dada às crianças. É muito difícil Kenji que crianças que tenham contato com a música queiram depois troca-la por balas. Parabéns pela iniciativa de participar dessa iniciativa.
ResponderExcluirJoão Pessoa PB.